O Pavilhão do Atraso



(Por: Mariano Andrade. Inspirado na brilhante ideia do meu amigo Andre Zaru)

O Museu do Amanhã foi recentemente inaugurado no Rio de Janeiro. Apropriado, não? País do futuro, Museu do Amanhã. É um futuro que nunca chegou e, do jeito que vai, nunca chegará. Se o museu fizer jus ao nome, o acervo será riquíssimo: inflação, desemprego, insegurança social, impostos. Tudo isso faz parte do nosso avenir.

Mas, para crianças e jovens, é importante estudar a História, para que entendam como pudemos chegar a este ponto. Portanto, parte do espaço no entorno do Museu do Amanhã poderia ser usado para abrigar o “Pavilhão do Atraso”, museu dedicado a ajudar as novas gerações a entender o porquê de o Brasil ser tão pobre socialmente, institucionalmente, tecnologicamente e, cada vez mais, economicamente.

Para acessar o Pavilhão do Atraso, o visitante teria que comprar seu ingresso na hora, pois não haveria venda pela internet. Ele entraria numa fila para pegar uma senha que lhe desse acesso à bilheteria. O pagamento seria somente em dinheiro, sendo que não seria garantido troco para notas acima de R$ 20. Cidadãos cariocas teriam direito a desconto na entrada, mediante a apresentação de cinco diferentes comprovantes de residência e últimos três carnês do IPTU (no caso de residir na cidade há menos tempo, seria necessário dirigir-se à Prefeitura para validar o desconto). Obviamente que os caixas vão conferir todas as cédulas e moedas para evitar falsificações, afinal todo mundo quer levar vantagem em tudo, não é mesmo?

Ao adentrar o Pavilhão do Atraso, o visitante estaria no Grande Hall dos Impostos, imponente sala recheada com bustos das siglas dos nossos noventa e tantos impostos, contribuições e taxas. Tudo em granito escuro, representando a transparência que o cidadão tem sobre o uso destes recursos. O observador atento notaria espaços vazios no Grande Hall, pois nossos legisladores certamente criarão novos impostos (para financiar a agenda progressista) e estes teriam seus bustos prontamente adicionados à coleção.

Em seguida, haveria uma sala intitulada “Cartórios: das Capitanias aos tempos atuais”, expondo a evolução desta tecnologia luso-brasileira. O acervo contaria com painéis mostrando a evolução dos selos cartorários ao longo dos séculos, dentre outros ítens de memorabilia.

Outras salas de destaque seriam a imponente “Caos na saúde pública: Peste bubônica, dengue, zika”, a surpreendente “Engarrafamentos e alagamentos urbanos através dos tempos – um registro multimídia” e a importante “Profissões tipicamente brasileiras: frentista, ascensorista, cobrador de ônibus, flanelinha e outras relíquias”. Sem esquecer de “Nossas conquistas trabalhistas”, com inestimáveis rascunhos e manuscritos que contribuíram para a gloriosa CLT. Em todas as salas, o visitante seria brindado com o que há de melhor na tecnologia nacional de improdutividade, culminando com “A grande sala dos carimbos”.

Contudo, a principal atração do Pavilhão do Atraso seria sua ala interativa, onde adultos e crianças poderiam colocar em prática diversos conceitos explorados na parte expositiva da visita. Haveria longas filas para cada sala (e não seria possível reservar horários com antecedência), mas com certeza a espera valeria a pena. Uma observação importante: para obter acesso à ala interativa, seria necessário conservar o canhoto do ingresso e depois carimbá-lo com a data de uso, serviço este disponível no guichê próximo aos banheiros. Isso evitaria que os espertos burlassem o sistema e reutilizassem ingressos. Tudo muito pensado e dimensionado.

A primeira atração interativa seria o “Fiorama”, uma cidade em miniatura onde todo o cabeamento elétrico é aéreo, reminiscência do século XIX. Os visitantes teriam as tarefas de substituir transformadores queimados, podar árvores que possam causar rompimento dos cabos e restaurar postes mal conservados com risco de cair. Será necessário um número elevado de participantes para que a cidade funcione bem, mas poucos times conseguirão concluir a atividade sem quedas de energia. Um realismo incrível.



Depois, haveria o concorridíssimo “Correio de Curitiba”. Nesta atividade, os participantes simulariam uma unidade postal onde chegam várias importações. O objetivo de cada equipe é demorar o maior tempo possível para liberar os pacotes e maximizar a taxação, com pontuação extra para extravio de mercadorias e taxação indevida.

Uma etapa importante seria a “Terra brasilis”, onde os visitantes aprenderiam sobre extrativismo, esta nossa brilhante atividade-mãe. Haveria um rio artificial para a prática do garimpo de pepitas de ouro, uma mini mina de minério de ferro para exploração, e uma mini fazenda para a colheita de café, cacau e outros produtos. Afinal, somos um país rico, nossa terra nos dá tudo.

O ápice da visita seria a “Viagem ao centro da lama”, onde diversos participantes competiriam por uma vaga no Congresso Nacional, numa emocionante simulação eleitoral. Cada candidato escolhe sua estratégia: filiar-se a uma legenda-de-um-nome-só para ser eleito de carona, aliciar diretores de estatais para financiar sua campanha prometendo favores se eleito, candidatar-se por estados onde nunca esteve, dentre outras. Estratégia e adrenalina puras.

E, para desanuviar o sistema nervoso, o tour seria encerrado no salão “Ela disse, Ele disse”. Neste suntuoso espaço multimídia, através de monitores CRT de última geração, os visitantes poderiam apreciar diversos discursos, entrevistas e declarações das autoridades brasileiras através dos tempos. Haveria muito material antigo, mas os tempos atuais estariam bem representados com “estocar vento”, “atrás da criança sempre tem um ser, que é um cachorro”, "a mosquita" e, claro, várias versões do “não sei de nada”.

Ao final do passeio, haveria uma área com redes e coqueiros para aqueles que desejem descansar, além de telões mostrando jogos de futebol. Tudo ao som de sambas-enredo e marchinhas de carnaval e com um pãozinho de cortesia para acompanhar. 

Será que este projeto qualifica para a Lei Rouanet?



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