Carroças


(Por: Mariano Andrade)

Parem as prensas!!! Já está à venda o Del Rey modelo 2017 top de linha. Opcionais desta versão mega-premium SLXX incluem: aquecimento, relógio, barra e cadeado anti-furto, luz interna, retrovisor do carona, pisca-pisca nas laterais e encostos para cabeça. Em 2018, o Del Rey SLXX terá trava elétrica.

O anúncio acima é obviamente uma ficção caricata. Ou, quem sabe, uma realidade paralela? Como seriam os automóveis de fabricação nacional se Fernando Collor, há quase 30 anos, não tivesse dito que nossos carros eram carroças?

À época, a declaração de Collor enfureceu a Autolatina – joint-venture entre Ford e VW que controlava cerca de 60% da produção nacional... Não pela Autolatina entender que Collor denegrira a imagem de seus produtos (os executivos sabiam que, de fato, os carros eram horríveis... bem como qualquer pessoa que já houvesse alugado um carro nos EUA ou Europa), mas sim porque estava claro que viria competição a qualquer momento.

De fato: Collor abriu o mercado para carros importados, que antes eram taxados proibitivamente. A Autolatina e seu exército de lobistas tentou de tudo para impedir a mudança, mas não houve jeito, a porteira estava aberta e a boiada estava a caminho para atropelar os fabricantes de carroças. Era o fim do “monopólio”, o fim dos dias em que a Autolatina tinha sua “bancada” no parlamento e uma oportunidade perdida de extirpar de vez o câncer dos sindicatos.

A chegada dos carros importados confirmou incontestavelmente a afirmação de Collor – nossos carros eram verdadeiras carroças. Os novos modelos disponíveis traziam inúmeros opcionais que, nos veículos nacionais, inexistiam ou só figuravam em certos “tops de linha” caríssimos, e para os quais era necessário esperar alguns meses pela entrega. Ítens de segurança que faltavam em nossos “possantes” eram, obviamente, verificados nos modelos importados básicos. Conforto, tecnologia, segurança e performance passaram a estar disponíveis ao consumidor sem que fosse necessário pagar um preço premium por eles.

Resultados de curto prazo: o market share dos importados bombou e as montadoras nacionais reclamaram adoidado vendo seu império ruir.

Resultados de longo prazo: os carros nacionais melhoraram substancialmente de padrão, bem como nossas normas técnicas para ítens obrigatórios de segurança, habilitando os automóveis de fabricação brasileira a serem comercializados em outros países. Com a melhora da relação custo-benefício, mais brasileiros puderam adquirir veículos próprios e a reposição de frota instalada tornou-se mais frequente.

Ou seja: o chororô foi à toa, pois, no longo prazo, houve maior geração de valor para todos, com maior mercado endereçável, mais impostos gerados, mais empregos e consumidores mais satisfeitos.

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O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, recentemente sancionou a lei que proíbe o Uber (e outros serviços similares) de operar na cidade. Ou seja, quer defender o atraso.


Os táxis cariocas – parafraseando Collor – são verdadeiras carroças. Mal-conservados, sem opções de pagamento via cartão, sem disponibilização de recibo, sem troco... um showroom de horror.

Exagero? Basta dar um pulinho em São Paulo e comparar. Naquelas bandas, a maioria dos táxis possuem bancos de couro, carregador de celular disponível para uso do passageiro e opção de pagamento com cartão de crédito. É quase impossível encontrar um motorista que não tenha troco ou recibo, que se vista mal, ou que recuse uma corrida. Já no Rio de Janeiro... Múuuuu...

O chororô dos taxistas cariocas é o eco da choradeira da Autolatina há quase 30 anos. Ninguém quer concorrência, e, quando ela aparece, vem a mania tupiniquim do direito adquirido e a alergia tropical ao livre mercado. É a mentalidade tacanha do “quanto mais caro eu puder cobrar pelo pior serviço/produto, mais esperto eu sou”. Imaginem se os acendedores de lampiões tivessem promovido quebra-quebra na rede elétrica no fim do século XIX? Ou se a Autolatina tivesse conseguido barrar os carros importados? Andaríamos de Del Rey 2017 à espera do modelo 2018 com trava elétrica.

Ocorre que os taxistas cariocas foram expostos: o serviço é caro e ruim. A porteira foi aberta. O consumidor não é bobo. Não há volta. No longo prazo, não há direito adquirido.

Algumas cooperativas de táxis já entederam a mensagem do livre mercado e passaram a oferecer melhores serviços (carros apresentáveis e equipados, motoristas mais atenciosos) e descontos nas tarifas. Objetivo: melhorar a proposta de valor para o cliente, recuperar volume de viagens e manter a atividade financeiramente interessante para o taxista.

Infelizmente, há uma banda de vândalos que opta pelo quebra-tudo, como aquele visto há alguns dias no aeroporto Santos Dumont. “Competir” desta forma com um concorrente que possui bolso mais fundo, melhor serviço/comodidade e preço mais baixo é a mais pura burrice. Caros taxistas, não se surpreendam se o Uber retaliar bancando 80% de desconto durante dezembro e acabar com o 13º salário de vocês...

Em resumo, é tolice tentar reverter a inovação tecnológica a fim de preservar feudos, é deletério no longo prazo. É necessário aliviar os custos de regulação para os taxistas e criar uma fiscalização mínima para o Uber e afins. E só. O restante, o mercado se encarrega de resolver.

Ou então, podemos continuar andando de carroça por aí. Segura, peão!




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